COMUNICADO DOS BISPOS CATOLICOS DE MOÇAMBIQUE (CEM) / 17 de Setembro de 2018
Reconhecendo e respeitando sempre a justa liberdade e responsabilidade que a todos compete na cidade terrestre, queremos, de forma solícita, voltar a sugerir alguns critérios gerais que são úteis para o discernimento na escolha dos Presidentes dos Municípios, Assembleias Municipais, Deputados a Assembleia da República e para a Eleição do candidato a Presidente da República. Estes critérios podemos encontrar nas várias Cartas Pastorais sobre Eleições da nossa Conferência Episcopal.
A caminho do fim do V ciclo governativo da nossa experiência democrática e, por conseguinte, a um ano das Eleições Presidenciais e Legislativas, as quais foram precedidas, já em Outubro passado (2018), pelas Eleições Autárquicas, desejamos que a busca da paz, a co-responsabilidade, a participação política e o zelo pelo Bem Comum, em ordem a melhoria das condições de vida de todos, movam permanentemente as mentes e os corações de todos vós.
Não há dúvidas de que, infelizmente, o presente ciclo governativo será recordado como um dos menos gloriosos da nossa democracia, e as razões que justificam esta avaliação não positiva são mais do que muitas. Entre elas merece particular destaque a paralisia de algumas instituições políticas e partidárias, determinada pelas prolongadas negociações entre o Partido da Frelimo, no Governo, e o maior Partido da oposição, a Renamo, no quadro do contencioso processo eleitoral de 2014.
O litígio entre o partido, no Governo, e a Renamo, em torno dos pleitos eleitorais de 2014, além de se ter degenerado em violência armada, particularmente nas províncias de Centro e Norte do Pais, também deu origem a uma situação de incerteza sabre o futuro político. As prováveis actividades políticas, institucionais e partidárias ficaram, por algum tempo, reféns do andamento das actividades militares e do resultado das conversações entre os dois principais partidos. Situação essa que felizmente, esta a ter uma evolução positiva e encorajadora.
Não obstante, nos últimos meses, uma nova ameaça de violência, protagonizada por um grupo armado "sem rosto", paira sobre Moçambique e, embora tenha sido localizado, não parece haver uma posição clara e determinante, a esse respeito, da parte daqueles a quem foi confiada a garantia da segurança colectiva.
Merece, igualmente, uma avaliação negativa a situação económica do país, caracterizada por uma progressiva deterioração, associada a erupção do escândalo das dívidas contraídas por alguns representantes do Estado, a margem das normas nacionais e internacionais, no que concerne a contratação de dívidas públicas.
A nebulosidade que paira nestes dois sectores, o da política e o da economia, tende a exercer, progressivamente e de forma galopante, uma influência negativa no desenvolvimento do país.
Por mais marcantes que sejam os episódios que caracterizam o presente ciclo governativo, não devem ser vistos de forma isolada. Eles são uma clara evidência de que os vinte e seis anos que passaram, depois do grande acontecimento histórico da assinatura dos Acordos de Paz de Roma e da inauguração do sistema democrático, foram atravessados por grandes atropelos.
Com as Eleições Autárquicas marcadas para Outubro do ano em curso e as Eleições Gerais marcadas para 2019, abre-se, diante de todos nós, a possibilidade de corrigirmos os erros cometidos, propondo caminhos de paz e de vida, de esperança e de prosperidade. Estamos, todos nós, como um corpo, diante de um grande desafio ao qual temos que responder com coragem e responsabilidade individual e colectiva, pois, está em questão o futuro da nossa terra, do nosso povo, das nossas famílias e de cada um de nós.
Como Pastores, atentos as sensibilidades do nosso povo, estamos conscientes de que, depois de muitos desenganos e desilusões, muitos moçambicanos, infelizmente, ganharam uma aversão a tudo o que é política, considerando-a uma actividade desonesta, praticada por aqueles que estão no poder com o fim de enganar o povo e de realizar os seus interesses pessoais ou de grupo. Os que assim pensam, renunciaram já ao próprio direito (e dever) de participar no exercício da selecção daqueles a quem é confiada, por um determinado período de tempo, a governação e a administração da "coisa" pública, de modo a alcançarmos o Bem Comum, acessível a todos os moçambicanos.
Queremos, aqui, reiterar que a política não pode ser considerada como uma arte de enganar. Ela é, por excelência, a arte de bem organizar e gerir a sociedade, de modo a alcançar os seus valores essenciais, tais como, a promoção integral da pessoa humana em todos os seus aspectos biológicos, psicológicos, sociais, morais e espirituais; promoção do Bem Comum entendido como criação de todas as condições necessárias para a passagem progressiva de situações menos humanas para situações mais humanas (Cf. Populorum Progressio nº 4), através da criação de instituições que garantam o respeito, a segurança e o bem-estar dos indivíduos e das famílias, e, finalmente, o conjunto dos direitos e liberdades fundamentais da pessoa humana.
O Papa Francisco tem retomado ensinamentos antigos da Igreja, entre os quais ensina que "a política é uma sublime vocação, é uma das formas mais preciosas da caridade, porque busca o Bem Comum" (Evangelii Gaudium, 205).
Nesta delicada hora histórica, incumbido de uma colectiva e importante responsabilidade de corrigir o próprio percurso histórico, o povo moçambicano necessita duma particular lucidez e clareza para que, através do programa político de um determinado partido político, instituições, organizações e serviços públicos, chegue a determinar o caminho político certo, capaz de garantir a realização da justa e real promoção do Bem Comum. Nos sistemas políticos vigentes, isso não é possível sem o exercício do acto da selecção daqueles a quem confiar a dinamização deste propósito.
É indispensável, por conseguinte, a escolha de um governo a quem iremos dar o direito de tomar decisões corajosas em nosso nome e em conformidade com o programa político que, através do voto, teremos legitimado.
Não é difícil, deste modo, perceber que as Eleições Autárquicas de 2018 e Gerais do próximo ano de 2019, estão revestidas de uma importância particular na história de Moçambique, quer porque acontecem numa fase histórica difícil, quer porque representam uma oportunidade capaz de criar condições adequadas para a abertura de uma nova página da nossa história política.
Por isso, não obstante as mudanças que nos apresenta a nova lei eleitoral, achamos oportuno continuar a insistir na adopção de alguns critérios que possam orientar esta acção democrática.
Queremos, por último, lembrar, que votar é um dever de todos, por isso, nenhum cidadão deveria abster-se da votação nas Eleições Autárquicas, Presidenciais e Legislativas.
Dom Francisco Chimoio, Presidente
17 de Setembro de 2018